terça-feira, 14 de abril de 2020

Como o cristão deve encarar a morte?

Como o cristão deve encarar a morte?
Como é duro perder um ente querido. Ministrei a Palavra de Deus em centenas de cultos fúnebres. Há um misto de impotência, silêncio, tristeza, alegria e esperança. Já participei de cultos fúnebres onde a presença de Deus permeava todo o ambiente e via no semblante dos entes queridos conforto e esperança. Já participei de velórios angustiantes onde a revolta a Deus e negação da morte eram insuportáveis. Como um cristão deve encarar a morte?

Pensar sobre a morte não é muito agradável para uma sociedade que tem valorizado demais a busca pela conquista na terra. Com o avanço da medicina e o saneamento básico, o homem do século XXI, em regiões desenvolvidas do mundo, vivem mais do que pessoas que vivem em regiões menos privilegiadas. Mas, seja no chamado desenvolvido com muitos recursos, ou no mundo chamado em desenvolvimento, todos encararão a realidade da morte.

Com a pandemia, a morte se tornou uma realidade mais presente e temida nesses últimos dias. A angústia, o pânico, a ansiedade e o medo estão tomando os corações. Não só tememos por nós, mas pela possibilidade de perdermos alguém a quem estimamos muito. Entretanto, se faz oportuno refletirmos sobre a morte e pensarmos em como cristão deve encarar a morte. Algumas verdades sobre a morte:

A morte é uma dura consequência da desobediência de Adão. Deus disse: “mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, Deus disse: ‘Vocês não devem comer dele, nem tocar nele, para que não venham a morrer.’” Gênesis 3:3. Entretanto, Adão desobedece a essa ordem dada por Deus. Percebemos aqui que a morte não fazia parte da condição original do homem, mas era uma possibilidade mediante a desobediência, o pecado.
O apóstolo Paulo declara que “o salário do pecado é a morte.” (Romanos 6:23a). “Portanto, assim como por um só ser humano entrou o pecado no mundo, e pelo pecado veio a morte, assim também a morte passou a toda a humanidade, porque todos pecaram.” (Romanos 5:12). “Visto que a morte veio por um só homem [...] Porque, assim como, em Adão, todos morrem [...]. (I Coríntos 15:21-22). 

Segundo a Palavra de Deus, existem três tipos de mortes: 1) Morte espiritual – Essa morte é a separação do homem de Deus pelo pecado. O homem sem Deus encontra-se morto espiritualmente. Paulo descreve essa aos Efésios: “Ele lhes deu vida, quando vocês estavam mortos em suas transgressões e pecados.” Efésios 2:1. Essa foi a condição de Adão, após a sua desobediência. Todo ser humano é gerado nessa condição. 2) Morte física – É o cessar da vida corpórea. O espírito se separa do corpo. “Porque, assim como o corpo sem o espírito é morto...” Tiago 2:26. “e o pó volte à terra, de onde veio, e o espírito volte a Deus, que o deu.” Eclesiastes 12:7. 3) Morte eterna – Essa é mais temida. Os perdidos a experimentarão. Perceba que não se trata de um fim existencial, mas de uma eterna separação de Deus. Ela é “um período infinito de punição e separação da presença de Deus”[1]. Jesus menciona esse lugar de punição: “Se a sua mão ou pé leva você a tropeçar, corte-o e jogue fora; pois é melhor você entrar na vida manco ou aleijado do que, tendo duas mãos ou pés, ser lançado no fogo eterno.” Mateus 18:8.

Uma vez apresentado esses conceitos, como o cristão deve encarar a morte?

Para alguém que não conhece a Cristo, a morte é uma maldição terrível, uma penalidade e um inimigo, pois, além de não ter nascido de novo, estando separado de Deus, ele enfrentará a segunda morte.
Para aqueles que creem em Cristo, portanto, declarados justos pela fé, a morte é encarada de outra maneira. A morte não é vista como um mero castigo, pois, eles sabem que não há nenhuma condenação sobre eles (Romanos 8:1). Para entendermos essa confiança, vamos aprender com o apóstolo Paulo:

1.      Como cristão, Paulo encara a morte como um inimigo vencido
“Porque, assim como, em Adão, todos morrem, assim também todos serão vivificados em Cristo.” I Coríntios 15:22. Todos que creem em Jesus já venceram a morte espiritual. Já não são mais separados de Deus (Efésios 2:1). Uma vez reconciliados com Deus, a morte já não pode mais nos separar do Seu amor. “Quem nos separará do amor de Cristo? [...] Porque estou bem certo de que nem a morte [...] poderá nos separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor.” Romanos 8:35, 38-39. O crente ainda passa pela morte física, mas não teme a sua maldição de separação eterna. Com expectativa espera a concretização total da vitória certa. A morte é um inimigo derrotado, porque os que estão em Cristo tem a certeza de que “é necessário que este corpo corruptível se revista de incorruptibilidade, e que o corpo mortal se revista de imortalidade. E quando este corpo corruptível se revestir de incorruptibilidade e o que é mortal se revestir de imortalidade, então se cumprirá a palavra que está escrita: ‘Tragada foi a morte pela vitória.” I Coríntios 15:53-54. Portanto, não tememos a morte e reconhecemos que ela é necessária para estar com o Senhor.

2.      Como cristão, Paulo encara a morte como algo necessário e desejável
“Minha ardente e esperança é que em nada serei envergonhado, mas que, com toda a ousadia, como sempre, também agora, Cristo seja engrandecido no meu corpo, quer pela vida, quer pela morte. Porque para mim o viver é Cristo, e o morrer é lucro. Entretanto, se eu continuar vivendo, poderei ainda fazer algum trabalho frutífero. Assim, não sei o que devo escolher. Estou cercado pelos dois lados, tendo o desejo de partir e estar com Cristo, o que é incomparavelmente melhor.” Filipenses 1:20-23
“Porque é necessário que este corpo corruptível se revista de incorruptibilidade, e que o corpo mortal se revista de imortalidade.” I Coríntios 15:53
Paulo, convicto de sua nova realidade em Cristo, certo da ressurreição e da vida eterna, demonstra ter uma luta interna quanto a viver e servir ou morrer e estar com Cristo. Esse certamente é o espírito de um cristão que não teme a morte. Paulo teve profundas experiências com Deus e não tinha a sua vida por preciosa. Cristo é quem vivia em Paulo. Seu coração pulsava pelo céu. Sendo ele um embaixador de Cristo, ansiava pelo seu país. Ele mesmo diz: Pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo”. Filipenses 3:20. Paulo ansiava por estar definitivamente em sua verdadeira habitação. Portanto, a morte é somente o meio de chegar lá, não como algo a ser temido, mas desejado.

3.      Como cristão, Paulo encara a morte como uma forma de se identificar com Cristo
“O que eu quero é conhecer Cristo e o poder da ressurreição, tomar parte nos seus sofrimentos e me tornar como ele na sua morte, para, de algum modo, alcançar a ressurreição dentre os mortos.” Filipenses 3:10. Nessa era da teologia do coaching e do triunfalismo gospel, soa estranho a muitos que participar dos sofrimentos de Cristo seja algo desejável. Mas, o desejo de se parecer e se identificar com Jesus é tão grande que Paulo almeja uma morte semelhante. Isso me remete aos apóstolos Pedro e João que se alegraram por serem açoitados e sofrerem afrontas por causa do nome de Jesus. A igreja de Esmirna receberia a coroa da vida sendo fiel até a morte, isto é, por meio do sofrimento. Paulo tinha uma teologia muito clara a respeito do sofrimento: “E, se somos filhos, somos também herdeiros; herdeiros de Deus e coerdeiros com Cristo, se com ele sofremos, para que também com ele sejamos glorificados. Porque tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não podem ser comparados com a glória a ser revelada em nós.” Romanos 8:17-18. Veja que a mente de Paulo está o tempo todo no céu. O sofrimento, conquanto que lhe desse a oportunidade de se identificar com Cristo, era desejável e a morte era apenas um rito de passagem.

4.      Como cristão, Paulo encara a morte como prova de fidelidade e obediência a Deus
Paulo se via como um soldado em guerra. Preso e caminhando para a sua morte, ele escreve ao seu discípulo Timóteo: “Quanto a mim, já estou sendo oferecido por libação, e o tempo da minha partida chegou. Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé.” II Timóteo 4:6-7. Será que Paulo é louco ou nós é quem precisamos experimentar um genuíno arrependimento para voltar os nossos olhos para o céu como nossa morada, de fato? Os mártires de todos os tempos deram suas vidas pela causa do evangelho. Não temiam a morte, antes, como o próprio Estevão, foi capaz de morrer pela causa pedindo que o Pai perdoasse seus algozes. Paulo não media esforços para obedecer a Deus expondo-se a situações de risco de morte. Foi apedrejado e dado como morte, sofreu naufrágio, picado por serpente e mesmo assim, não deixou de obedecer. Ele não temia a morte, antes a via como uma oportunidade de se identificar com Jesus, a desejava e sabia que pela ressurreição de Jesus, ela é um inimigo vencido. Isso é confiar inteiramente na graça de Deus.

Mas, você pode me perguntar: Então não devemos sofrer quando nossos entes queridos partem? Claro que sim! Choramos e nos entristecemos, mas não como os descrentes! Paulo escreveu: “...não fiquem tristes como os demais, que não têm esperança. I Tessalonicenses 4:13b. Jesus chorou ao saber da morte de seu amigo Lázaro. O luto existe, mas Jesus nos deu um novo significado. Os incrédulos choram sem nenhuma esperança de futuro. Mas, Jesus disse: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá.” João 11:25. Devemos sim chorar e externar nossa tristeza. “Bem aventurados os que choram, porque serão consolados.” Mateus 5:4. O sentimento de luto é normal e saudável, mas ele não pode ser tornar algo patológico e nocivo. Nós temos uma viva esperança.

Para concluir, nesses tempos de pandemia no qual a morte está diante dos nossos olhos e pode alcançar a qualquer um de nós, temos a oportunidade de refletirmos sobre o modo como temos vivido e sobre o que realmente dá sentido à nossa existência. Jesus nos chamou para vivermos uma vida simples. Não se trata de ter muito ou pouco, mas de ter contentamento não em posses, mas em Deus e no Seu Reino. Valorizar a família, a si mesmo, e sobretudo, ter um único Deus em sua vida, e não outros deuses tais como a si próprio, o dinheiro ou uma carreira. Quando você morrer, pelo que deseja ser lembrando? O que as pessoas (seu cônjuge, filhos e amigos) dirão a seu respeito? Paulo deixou a pista para Timóteo: “combati o bom combate, completei a carreira e guardei a fé.
Não temamos a morte! Vivamos com nossos pensamentos nas coisas do alto (Colossenses 3:1-3). Nossa vida terá sentido e propósito e a morte será apenas para nos apropriarmos definitivamente de nossa pátria celestial.

No amor de Cristo,
Rodrigo Rodrigues Lima, Pastor
Igreja Metodista Livre de Vila Moraes



[1] ERICKSON, Millard J. – introdução à Teologia Sistemática p.484